Depois de um longo e não tenebroso fim de verão e início de outono, de volta estou!

Após o último texto estive absorvido em tarefas do Doutorado tais como a minha QUALIFICAÇÃO na qual fui aprovado e agora estou apto a tentar me tornar Doutor em Ed. Física. Também participei do II Congresso Mineiro de Fisiologia do Exercício em Ouro Preto apresentando alguns resultados da minha tese e, isso me tomou tempo de trabalho e leitura prejudicando o seguimento aqui. Também aproveitei pra descansar um pouquinho no feriado porque ninguém é de ferro, né?

Mas agora falando do que interessa. No último texto falei algumas coisas sobre a tão valorizada Prática Baseada em Evidências que vamos chamar daqui pra frente de PBE. Combinado?

Você profissional de Ed. Física ou praticante de exercício precisa ter em mente uma coisa: a PBE tem limitações e não é possível prescrever 100% do tempo se baseando 100% em evidências.

Chocado? Passada? Pois é… mas isso não é um problema. Pensa comigo, eu vou treinar um homem jovem de 23 anos que quer melhorar o desempenho dele no futebol ao longo deste ano. Dificilmente encontrarei evidências de treinamento para ele com a duração de 8 meses. Se encontrar alguma coisa terá um desfecho muito específico do tipo: o treino XPTO reduziu as lesões nesse período. Ok. É positivo, mas ele correu mais rápido? Saltou mais alto?

Então você deve inventar algo novo da sua cabecinha linda? Não!

O que fazemos na maioria das vezes é basear os próximos passos da prescrição em resultados de testes e evidências aproximadas da nossa realidade, da experiência de quem estamos treinando, das suas preferências e da nossa experiência enquanto treinadores. Algo como a figura abaixo:

Em um artigo recente Henning Wackerhage e Brad Schoenfeld propõe o uso do termo “Treinamento Informado por Evidências” que vamos chamar de TIE. Significa que uma parte das decisões para a prescrição do treinamento foram baseadas em evidências robustas e de boa qualidade metodológica, porém, limitadas. Porém, as outras decisões após estas são tomadas baseadas na experiência profissional. Elas são resultado de leituras complementares, experiências práticas e percepção individual para cada aluno treinado. Aqui é preciso levar em conta também as preferências e experiências do sujeito em treinamento.

Os autores então propõem uma prescrição baseada em 6 passos:

1. Definição do objetivo geral:
   Estabelecer o objetivo principal do treinamento (ex: melhorar o desempenho no futebol).

2. Desdobramento em metas específicas:
   Traduzir o objetivo geral em metas mensuráveis (ex: aumentar a força, melhorar o salto vertical, velocidade em 30m), verificando se são realistas com base em dados prévios.

3. Planejamento de testes e monitoramento:
   Escolher testes válidos e confiáveis para acompanhar as adaptações. O monitoramento regular é essencial, pois as respostas ao treino podem variar muito (inclusive com possíveis respostas adversas).

4. Escolha das intervenções:
   Selecionar estratégias de treinamento e outras intervenções para atingir as metas, utilizando evidência científica sempre que possível.

5. Planejamento das variáveis de treino:
   Organizar variáveis-chave (ex: volume, frequência, intensidade) ao longo do tempo e ajustar conforme o perfil e as necessidades do praticante, adotando uma abordagem centrada no indivíduo.

6. Elaboração das sessões semanais:
   Com base nos passos anteriores, criar planos de treino semanais ou sessões individuais detalhadas, garantindo coerência com os objetivos, evidências e preferências do praticante.

Além disso, os autores propõem alguns passos para formular a sua PBE e aplicá-la:

1. Formule recomendações claras e quantitativas
   Com base em boa literatura científica, defina intervenções com precisão, como:
   "Treinar 3 × 30 min por semana durante 6 semanas para melhorar B em X%".

2. Descreva criticamente a evidência
   Escreva um parágrafo explicando os estudos que embasam sua recomendação, considerando sua qualidade e limitações.

3. Classifique a qualidade da evidência
   Use sistemas como o GRADE para indicar a robustez da evidência, justificando sua avaliação em 1–2 frases.

Outros aspectos importantes a serem levados em consideração na prescrição e evolução do treinamento ao longo do tempo são:

1. Segurança em primeiro lugar
   Avalie riscos do plano e implemente medidas preventivas para garantir segurança.

2. Concordância e motivação do praticante
   Um plano só é eficaz se for aceito pelo atleta/cliente/paciente. Alinhe metas e métodos com ele(a).

3. Mudança e manutenção de comportamento
   Use estratégias baseadas em evidências para ajudar o indivíduo a iniciar e manter os exercícios, especialmente em casos de baixa motivação.

4. Personalização contínua
   Como não há biomarcadores definitivos de treinabilidade, monitore a resposta do indivíduo (ex: potência, carga levantada). Se não houver progresso, ajuste a carga ou mude a abordagem.

É importante que você tenha em mente que apesar de ser uma abordagem subjetiva ela apresenta pontos firmemente apoiados em evidências científicas (que você selecionou) e em testes de controle. Se alguém falar que trabalha com um aluno há anos sempre baseado em evidências, desconfie.

A Ciência do Exercício é excelente, tem pesquisadores de altíssimo nível mas como todas as outras, tem suas limitações. O que não significa que os achismos, modismos do TikTok e videos no YouTube muitas vezes baseados nas preferências pessoais dos autores são verdades incontestáveis.

Existe evidência alta qualidade para que você possa ler e embasar suas decisões nelas e, quando atingir os limites delas, possa tomar boas decisões baseando-se nelas, na sua expericência profissional e nas particularidades do seu aluno. É o seu momento de aplicar a Ciência na sua Prática e traduzir tudo aquilo que você estudoum em sessões de treinamento.

Profissional ou estudante, lembre-se, dúvidas são comuns e surgirão sempre. Contudo, a melhor maneira de resolvê-las ainda é lendo e se baseando no que as evidências apontam. Achar alguma coisa até pode resolver o problema uma vez, mas um bom profissional é consistente em resolver vários problemas várias vezes.

Por fim, você praticante, escolha bem o profissional que te acompanha e pergunte

onde ele anda estudando para montar os seus treinos. Você pode se surpreender.

Até daqui a 15 dias!

Tenha um ótimo domingo!